Schadenfreude: o meu prazer em ver a sua desgraça

Ponto de partida para discutir o Princípio da Inocência

Publicado por Wagner Francesco

“De origem alemã, a palavra Schadenfreude (*) é composta de Schaden (dano) e Freude (alegria). É basicamente o seguinte: o prazer que temos quando vemos os outros com problemas; é a alegria que sentimos quando recebemos a notícia que alguém se deu mal. É a palavra chique para “pimenta no c* dos outros é refresco”.

Schadenfreude é também chamado de “o prazer perverso”, ele é visto como aquela coisa que sentimos quando alguém, que está numa posição melhor que a nossa, “se ferra na vida” e a gente sente aquela pontada de alegria e realização. Sabe aquele sentimento de querer que o fulano bem sucedido caia n’alguma desgraça? Sim, é Schadenfreude.

No entanto quero partir de um outro ponto de vista. E por que esta palavra é importante para o Direito Penal? Ora, você vai saber agora: é que quando sentimos prazer em ver alguém se dar mal, a primeira coisa no Direito Penal que sofre é o Princípio da Inocência.

E agora, que quero ir por um outro ponto, fora da ideia de que sentimos inveja (apenas) de pessoas mais bem colocadas socialmente que nós, podemos nos perguntar: e quando uma pessoa, qualquer pessoa, aparece na mídia sendo acusado de cometer algum ato ilícito a nossa primeira reação é a de o condenar sumariamente, isto seria o quê? Schadenfreude, sem dúvida! E esta indignação macabra que sentimos quando alguém que sumariamente condenamos é inocentado, o que seria isto? Schadenfreude! Lógico.

É porque a gente sente prazer na desgraça do outro, a gente gosta quando alguém vai ser penalizado, vai ser condenado. No fundo, no fundo, talvez seja um pouco de inveja. Calma, não é inveja do moço que fez besteira, mas inveja da pessoa que nós queríamos que fôssemos. Queríamos ser bons, santos, corretos, mas, no fundo, no fundo, somos tão errados quanto um monte de gente é.

A gente gosta de punir o outro, sem provas, sem julgamento, sem ouvir, porque a gente olha o estranho e quer condenar não só ele, mas aquele “eu” que é verdadeiro em nós. É o prazer na desgraça do outro como se fosse “o nosso eu errado” quem estivesse sendo punido também. É uma forma de aliviar o peso da consciência…

É preciso abandonar o prazer na desgraça do outro para que a gente cumpra o que diz a Constituição Brasileira (http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constituição-federal-constituição-da-republica-federativa-do-brasil-1988)

Art. 5º, LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

Somos todos inocentes até o trânsito em julgado, mas não aceitamos isto porque, dominados pelo Schadenfreude, o outro já é condenado a priori por causa do prazer que todo este sofrimento alheio nos causa. E este discurso de que “punição demais nunca é pouco” é apenas a falácia de um espírito que quer pintar para si próprio e para a sociedade um quadro de perfeição. Esconde, no entanto, o lado sombrio da humanidade.

O inferno são os outros e o inferno dos outros causa paz em nós.

Ser dominado pelo Schadenfreude é humano, demasiado humano, o problema é quando este sentimento começa a interferir na ordem de um Estado democrático de Direito.

Caro leitor, apesar dos possíveis prazeres que a desgraça de outra pessoa possa causar em nós, ele tem que continuar sendo inocente até que o contrário seja provado.”

(*) Grifo nosso em itálico, em destaque ao argumento do autor.

Para saber mais sobre Schandenfreude:

O prazer na desgraça alheia http://oglobo.globo.com/sociedade/saude/prazer-na-desgraca-alheia-11191687.

The Joy of Pain: Schadenfreude and the Dark Side of Human Nature http://www.amazon.com/The-Joy-Pain-Schadenfreude-Nature/dp/0199393710

Neuroscience of Envy and Schadenfreude http://scienceblogs.com/purepedantry/2009/04/14/neuroscience-of-envy-and-schad/

Autor:

Wagner Francesco http://wagnerfrancesco.jusbrasil.com.br/

Teólogo e acadêmico de Direito. Nascido no interior da Bahia, Conceição do Coité, formado em teologia e estudante das Ciências Jurídicas. Fã de Heavy Metal. Pesquiso nas áreas da Teologia da Libertação e as obras do Karl Marx e Jacques Lacan aplicadas ao Direito.

Página no Facebook: https://www.facebook.com/escritor.wagnerfrance

Amplie seu estudo

Estado Democrático de Direito http://www.jusbrasil.com.br/topicos/293801/estado-democratico-de-direito

Presunção de Inocência http://www.jusbrasil.com.br/topicos/297140/presuncao-de-inocencia

Princípio da Inocência http://www.jusbrasil.com.br/topicos/352397/principio-da-inocencia

Psicologia http://www.jusbrasil.com.br/topicos/1679118/psicologia

Inciso LVII do Artigo 5 da Constituição Federal de 1988 http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10728238/inciso-lvii-do-artigo-5-da-constituicao-federal-de-1988

Direito Penal http://www.jusbrasil.com.br/topicos/26413229/direito-penal

Psicologia Jurídica http://www.jusbrasil.com.br/topicos/27253046/psicologia-juridica

Tópicos de legislação citada no texto

Constituição Federal de 1988 http://www.jusbrasil.com.br/topicos/302754/constituicao-federal-de-1988

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