Minha mulher falou: “Hoje não!” é estupro?

Publicado por Professor Valter dos Santos

Antes de entramos no tema do título acima, cabe tecermos breves comentários acerca dos tipos (espécies) de estupro.

Primeiramente, temos capitulado no artigo 213, do Código Penal, o primeiro tipo (espécie) de estupro. Que consiste no seguinte:

(…) “Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso:

Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos”.

Observe o verbo “Constranger” o qual já cabe uma explicação.

Perceba que o legislador não distingue a vítima do estupro, se pessoa do sexo masculino ou feminino. E porque esclareço isto? Pois, até 2009, somente a mulher poderia ser vítima de estupro.

Contudo, com o advento da lei n. 12.015/2009, que revogou o artigo 214, do código penal, que em tese capitulava o crime de estupro contra pessoa do sexo masculino. Porém, com o título de (Atentado Violento ao Pudor).

Creio que a ideia o legislador fora fixar políticas de igualdade de gêneros.

Superado estes esclarecimentos iniciais, passemos para o segundo tipo (espécie) de estupro constante no Código Penal Brasileiro, que é o estupro de VULNERÁVEL, capitulado no artigo 217-A o CP, que diz:

(…) “Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos”.

Perceba que o legislador já não usa o verbo “Constranger”, mais tão somente o verbo “ter” conjunção carnal (que nada mais é do que a introdução do pênis na vagina), ATENÇÃO (…) ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos. Essa segunda parte é o apalpar, tocar, acariciar a pessoa menor de 14 (catorze) anos, já estaria caracterizado o crime de ESTUPRO DE VULNERÁVEL. Outra observação importante, é que neste caso tanto faz o consentimento da vítima, pois, é irrelevante e não descaracteriza o delito ou mesmo sua eventual “experiência” sexual anterior, já que a presunção de violência é de caráter absoluto.

Ou seja, para o legislador, nesse caso pouco interessa se a pessoa menor de 14 (catorze) anos, já teve outros relacionamentos sexuais, ou não; se ainda é virgem (intocada, “pura”), não importa. Praticou quaisquer das condutas desse artigo, está configurado o ESTUPRO DE VULNERÁVEL.

O legislador ainda tipifica mais duas condutas que pode ensejar no cometimento de ESTUPRO DE VULNERÁVEL, além da condição de ser a vítima menor de 14 (catorze) anos para que se possa incorrer (cometer) o crime acima, veja o que diz o parágrafo primeiro do artigo 217 – A do Código Penal:

(…) “§ 1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência”.(grifei)

(…) com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, (…)

Aqui o legislador está protegendo aquelas pessoas que se encontram enfermas (doente) impossibilitadas de se defenderem, e mesmo assim, o indivíduo mantém com ela conjunção carnal, a toca, apalpa etc.

Já na segunda parte do mesmo parágrafo, o legislador continua (…) ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.

Nesse caso, resta configurado o ESTUPRO DE VULNERÁVEL, quando o indivíduo tem conjunção carnal, ou simplesmente toca, apalpa, acaricia, passa a mão em pessoa desacordada, dopada, embriagada (bêbada).

O mais comum, nesse último caso é quando o estuprador dar para a vítima o “boa noite Cinderela”, e depois abusa sexualmente da vítima. Logo comete igualmente o crime de ESTUPRO DE VULNERÁVEL, com pena de até 20 (vinte) anos de reclusão, independentemente da idade da pessoa, pois, aqui a violência certamente é presumida.

Mais voltamos agora ao título do nosso artigo, pois, a maior parte dos crimes de estupro acontece no seio familiar.

Em muitos casos por questões culturais bestializadas e machistas, de pura ignorância e arrogância social.

Perceba que logo no inicio do no artigo, já localiza-se o verbo “constranger” que de acordo com o dicionário léxico[1] significa

  1. “Forçar uma pessoa a realizar alguma coisa que a mesma não quer; obrigar, coagir ou impor;
  2. Inibir a movimentação de; segurar, premer ou apertar;
  3. Embaraçar, atrapalhar ou acanhar; colocar alguém numa situação desconfortável”;

Portanto, é a falta de concordância da outra pessoa, é o “hoje eu não estou a fim”. Logo esse constrangimento é uma violência grave contra a liberdade de consentimento da outra pessoa e, por conseguinte, é estupro sim!

[1] http://www.lexico.pt/constranger/

Professor Valter dos Santos

Professor VALTER DOS SANTOS é Sócio do escritório AUGUSTINIS, CHINEN, DIAS e DOS SANTOS ADVOGADOS ASSOCIADOS; tem Especialização em MBA Executivo em Gestão em Estratégia Empresarial pela Universidade Cidade de São Paulo. Bem como é graduado em processos Gerenciais pela mesma Universidade.

(Fonte: http://santosvalter.jusbrasil.com.br/artigos/346653704/minha-mulher-falou-hoje-nao-e-estupro, data de acesso 10/06/2016)

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